
Michael Anthony admira tanto a alface-manteiga que tem comprado durante o
último mês, que inventou uma salada própria para ela. O prato de US$ 12 servido
no Gramercy Tavern em Manhattan, também leva picles de berinjela, ricota, picles
de cerejas, e tomates 'selvagens’ – mas as folhas são a estrela, e com
razão.
Frequentemente colhida apenas algumas horas antes de chegar em sua cozinha, a
seis quilômetros da fazenda, a alface não poderia ser mais fresca, ou mais
local. Ela possui quase tudo o que um chef exigente poderia pedir, exceto uma
coisa: terra caindo de suas raízes.
A alface-manteiga é cultivada na Gotham Greens, novo jardim hidropônico na
Greenpoint industrial, que coloca as sensações românticas da fazenda no coração
da cidade. Em uma estufa de US$ 2 milhões, pequenos brotos emergem de sementes
embutidas em pequenas esponjas, feitas de fibras fiadas de basalto
vulcânico.
Água? É reciclada, de modo que apenas 2.650 litros sejam usados diariamente,
um décimo do volume usado no cultivo convencional. Solo? É substituído por finas
películas de água rica em nutrientes, servindo a centenas de leitos plásticos
que embalam as raízes de verduras, alfaces e ervas culinárias.
O lustroso jardim, que de maneira improvável pousou no teto de um enorme
prédio de dois andares – antigamente um boliche e espaço fabril – é uma das
maiores estufas hidropônicas em escala comercial da América urbana, fornecendo
uma produção primitiva e sustentável para restaurantes e varejistas de alto
padrão.
Até recentemente, existiam duas associações comuns à hidroponia: maconha e
falta de sabor. Mas, as operações de estado de arte ganharam convertidos entre
os chefs que veneram a produção local e que celebram o 'terroir’.
“Esse volume de produção e esse nível de perícia é algo que nós nunca
havíamos visto antes”, diz Anthony, sobre a produção da Gotham Greens. “Eles
elevaram o negócio a outro nível”.

Chang W. Lee/The New York Times

Stewart Cairns/The New York Times
Até agora, a produção hidropônica “não substitui as verduras e legumes
cultivadas nos campos” na cozinha da Gramercy Tavern, diz ele. No momento,
“funcionam mais como um 'ator coadjuvante”'. E embora o abastecimento de
produtos tenha rotatividade anual, e teoricamente possa corromper a crescente
obsessão dos chefs pela sazonalidade, “ela realmente não desafia a nossa noção
sobre as temporadas”, adiciona Anthony.
Mesmo assim, para André de Waal, chef e proprietário do elegante André’s
Restaurant em Newton, Nova Jersey, “é tudo uma questão de escolha”. Ele tem
comprado verduras hidropônicas há um ano de uma pequena estufa rural, a 15
minutos de seu restaurante, e diz que as verduras da Califórnia já estão com
mais de três dias de idade, quando são entregues.
“Podendo escolher entre verduras cultivadas em solo, mas já velhas, e
verduras hidropônicas super frescas, eu prefiro comprar as hidropônicas”, diz de
Wall. “Não existe nada igual à sensação de trabalhar com produtos que já estão
velhos”.
Os defensores da produção das estufas urbanas, há muito enaltecem os
benefícios da proximidade, frescor, qualidade e geração de empregos.
“Para determinadas culturas, a hidroponia pode ser uma dádiva”, diz John
Magazino, presidente da Primizie Fine Foods no Bronx, fornecedora de alto padrão
de produtos que tem vendido safras hidropônicas, de fornecedores rurais para
restaurantes. “Alface, chicórias, endívias e todas as ervas frescas vendem
extremamente bem. E se a Gotham Greens puder cultivar cerefólios, que são
difíceis de cultivar e transportar, ela fará a felicidade de muitos chefs de
Nova York”.
Nem todos concordam. John O’Neil, vice-presidente sênior encarregado de
compras para o Patina Restaurant Group, é um purista, que rejeita os produtos
hidropônicos para os restaurantes da companhia, “porque eles parecem ser
bonitinhos, mas lhes falta sabor”, diz ele. “Escolho a Mãe Natureza, todas as
vezes”.
As culturas de campo, no entanto, também podem ser desafiadoras ao paladar,
porque “podem ser afetadas por chuva demais, falta de chuva, muito sol, ou falta
de sol”, diz Gene A. Giacomelli, designer hidropônico e professor de engenharia
agrícola na Universidade do Arizona. Tanto para produtos cultivados em solo
quanto os hidropônicos, diz ele, o sabor pode ser uma complexa mistura de
genética, cultivares da planta (diferentes espécies), condições de cultivo e
gerenciamento agrícola.
O’Neil talvez seja um foco de resistência incomum no mundo dos restaurantes
de alto padrão, já que muitas cozinhas vêm utilizando produtos hidropônicos
suplementares há meses, quando as fazendas comuns estão dormentes. No entanto,
os chefs raramente vangloriam-se sobre o assunto, por causa do suposto estigma
da falta de sabor.
Mas a produção hidropônica de alta qualidade e relativamente local, apenas
recentemente tem aumentado sua disponibilidade, e “não apenas o mercado para
essa produção está crescendo”, diz Giacomelli, “como também existe uma demanda
do consumidor, e as pessoas estão dispostas a gastar mais para adquirir os
produtos”.
Jenn Nelkin, a diretora da estufa Gotham Greens, de 32 anos de idade, diz que
“nós criamos do nada nossas receitas para os nutrientes, e há uma receita
diferente para cada planta”. O sabor, complementa ela, vem de uma variedade de
compostos que incluem açúcares e óleos essenciais, e “se o produto for colhido
já maduro, o sabor vai estar presente da mesma maneira”.
É claro, nem todos os fazendeiros de solo estão preparando-se para marchar
até a Gotham Greens com tochas em punho, para colocar a cabeça de Nelkin numa
estaca. Na verdade, “nós usamos métodos hidropônicos, irrigação por gotejamento
e fórmulas de alimentação constante, para estender nossa temporada de cultivo”,
diz Richard Ball, proprietário das fazendas Schoharie Valley em Schoharie, Nova
York, e fazendeiro especializado pioneiro, que há muito tempo abastece cozinhas
de alto padrão.
Porém, diz ele, o cultivo hidropônico “demanda capital e mão-de-obra
intensivos, e requer manutenção sofisticada”.
As raízes, no solo de terra funda de Ball, rico em profundos depósitos
glaciais de argila de silte, podem perfurar o solo por 3 metros ou mais.
“Eu argumentaria com fervor, dizendo que não há dúvida de que as pessoas
podem sentir a diferença”, diz ele. “Na teoria, faz sentido que você possa
ajustar os nutrientes no cultivo hidropônico, mas os solos são muito complexos.
O solo é uma coisa viva. Você não consegue reproduzir meu solo em uma fazenda
hidropônica”.
Giacomelli diz que “nós podemos não conhecer absolutamente todos os
nutrientes que podem ser retirados do solo”, e adiciona, “mas em um teste de
paladar, a pessoa frequentemente não consegue enxergar a diferença” entre safras
de cultivo hidropônico ou convencional.
Sem dúvida, as instalações hidropônicas modernas mostram um grau crescente de
sofisticação tecnológica. Enquanto os 25 empregados da Gotham Greens propagam,
colhem e embalam à mão a produção, em seu espaço de 1.394 metros quadrados, uma
estação meteorológica no telhado monitora ventos, chuva, temperatura, umidade,
dióxido de carbono e intensidade da luz. Essa riqueza de dados trabalha para
regular as bombas de irrigação, os respiradouros da estufa, os exaustores, as
persianas do espigão e as cortinas de sombra.
Toda essa ambientação ajuda as safras a crescerem sem o uso de pesticidas,
fungicidas ou herbicidas, e controladores naturais de pragas – como insetos
parasitoides, crisopídeos e joaninhas – são introduzidos na estufa de 5 metros
de altura, com seu piso principal de produção de 23 por 49 metros.
Enquanto todos os dados eletrônicos estão disponíveis no computador central
do teto do edifício 810 da rua Humboldt, Nelkin, que também é sócia da
companhia, pode visualizá-los em seu celular e conduzir a operação de qualquer
lugar no planeta.
A única realidade dos velhos tempos a invadir essa fantasia futurística é o
perfume exótico do pão de centeio escuro lituano e dos 'paczki’ (roscas
polonesas), vindo dos fornos da Syrena Bakery, confiável panificadora polonesa a
um quarteirão de distância.
Segundo Giacomelli, existem nos Estados Unidos apenas algumas poucas estufas
em escala comercial como a Gotham Greens. A produção anual projetada da estufa,
de 100 toneladas, é apenas uma minúscula fatia das mais de 1,5 milhão de
toneladas que são importadas para Nova York, o maior mercado agrícola do mundo,
e chega a ser insignificante quando comparada à do 'grande hidro’. Isso é o
inventário das vastas operações de hidroponia comercial em áreas esparsamente
habitadas do Arizona, Califórnia e Texas, onde a terra é barata e as estufas
podem se estender por até 146 hectares.
Mas, por causa do aquecimento global, secas, instabilidade meteorológica e
custos de energia em alta, a agricultura hidropônica, com produção dez vezes
superior em relação à das safras cultivadas em solo, faz cada vez mais
sentido.
“Todos nós estamos sujeitos aos recursos limitados no nosso planeta”, diz
Giacomelli, “e precisamos aumentar os esforços para alimentar maiores
quantidades de pessoas, com cada vez menos recursos”.
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