Nove comunidades com alto risco de desabamentos aguardam
obras de contenção
Mariana Costa

Presidente da associação de moradores, José
Carlos aponta para área da Chacrinha onde é comum haver deslizamentos
Basta o céu escurecer e o tempo fechar para
que o gari Gustavo dos Santos, de 38 anos, comece a ficar tenso. Apreensivo,
ele mantém as portas de casa abertas na expectativa de garantir a saída rápida
da mulher e dos filhos em caso de emergência. A lembrança do temporal que levou
a casa e quase todo o patrimônio da família há cinco anos ainda está bem viva
na memória do morador da favela da Chacrinha, na Tijuca, zona norte do Rio.
Encravada em meio à mata e a rochas do maciço da Tijuca, a Chacrinha cresceu em
uma área com “altíssimo risco de deslizamentos” em caso de chuva forte, segundo
mapeamento feito em dezembro de 2010 pela Geo-Rio (Fundação Instituto de
Geotécnica do Município do Rio), oito meses após a tragédia causada pelas
chuvas de abril do ano passado.
Após o levantamento, as 310 casas da
Chacrinha, construídas junto a enormes pedras e em um terreno bastante íngreme,
foram interditadas pela Prefeitura do Rio, que também proibiu a construção de
novas residências. Mas, sem alternativas, a maioria dos 2.000 moradores
permanece na comunidade. Sem fiscalização efetiva, novas construções continuam
sendo feitas na favela, pacificada em setembro de 2010.
Apesar de saber do risco que corre, o gari
está construindo um segundo andar na casa onde mora, para dar mais conforto à
mulher e aos dois filhos que ainda vivem com o casal. Ele se ressente de jamais
ter recebido qualquer indenização pela casa que perdeu na enxurrada. A casa
onde vive atualmente, a poucos metros da que desabou, é uma das poucas que não
foi interditada, embora esteja abaixo de outros imóveis condenados.
- Fiquei traumatizado. O tempo começa a mudar eu já fico nervoso. Deixo sempre
a porta de casa aberta caso haja uma emergência. Quando chove, presto atenção a
qualquer barulho.
Presidente da associação de moradores, José
Carlos Cândido da Silva, mostra uma pasta repleta de recortes de jornal e
documentos, entre os quais, um ofício enviado ao gabinete do prefeito Eduardo
Paes (PMDB) em 17 de janeiro deste ano. No texto, ele alerta para a situação
“de extremo risco” da comunidade e pede obras de contenção, que, quase um ano
depois, ainda não chegaram.
- A Geo-Rio esteve aqui, os técnicos fizeram medições, mas, até agora, não
houve uma obra sequer. É preciso fazer uma contenção. Temos uma ribanceira que
há 30 anos cai quando chove. A gente vai lá e limpa. Chove e cai de novo.
A prefeitura afirma que nem todas as famílias que vivem em área de risco
precisam ser reassentadas, já que, em muitos casos, é possível fazer obras de
contenção que garantam a segurança dos moradores. Em nota, a Geo-Rio
informou que está “finalizando os projetos executivos para iniciar as obras
adequadas em cada região identificada com risco no município. O processo é
minucioso e contínuo”.
Segundo a Secretaria Municipal de Habitação, 200 famílias da Chacrinha já foram
reassentadas. Outras 150 devem ser retiradas em três meses. Desde
janeiro de 2009, a
Prefeitura do Rio removeu 14,5 mil famílias por diferentes motivos.
Moradores temem ir para área de
milícia e tráfico
O presidente da associação de moradores, no entanto, contesta a informação.
José Carlos diz que menos de dez casas foram demolidas este ano na Chacrinha e
que as famílias retiradas viviam na localidade conhecida como Pedacinho do Céu,
que não faz mais parte da comunidade, segundo nova demarcação feita pelo
próprio município.
Além disso, muitos moradores temem ir para conjuntos habitacionais construídos
pela prefeitura em bairros onde há presença de milicianos e traficantes, conforme
explica José Carlos.
- A opção que a prefeitura nos dá é ir para Senador Camará ou Cosmos. Imagine
se você está empregado aqui. Vivemos em uma área pacificada. Lá são áreas
dominadas por bandidos ou milicianos. Quem vai querer ir?
Outras oito comunidades vivem a mesma situação da Chacrinha, com 100% das suas
casas com risco alto de desabamentos: Sítio do Pai João, no Itanhanguá, na zona
oeste (300 casas interditadas); morro da Cotia, no Lins, na zona norte (210);
travessa Antonina, na praça Seca, na zona oeste (175); morro da Bacia, no
Engenho Novo, na zona norte (120); rua Mira, em Olaria, na zona norte (75);
morro do Rato, no Estácio, na zona norte (65), e morro do Bananal, na Tijuca
(30).

Gustavo teme perder a casa mais uma vez, mas
não quer sair da Chacrinha, onde vive há mais de 30 anos (Mariana Costa / R7)
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