De olho na reeleição, Planalto agora quer virar a página da Copa. Oposição, no entanto, compara Dilma a Felipão e já chama a atenção para o futuro dos estádios do Mundial
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Dilma foi vaiada ontem quando entregava a taça ao time alemão. Assessores dizem que ela não se abalou - Ivo Gonzalez / Ivo Gonzalez
por Maria Lima, Mariana Sanches, Ana Paula Ribeiro e Catarina Alencastro - O Globo
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BRASÍLIA e SÃO
PAULO - Aliados da presidente Dilma Rousseff querem sepultar o tema Copa do
Mundo — e também a derrota da seleção — para evitar que o mau humor dos
brasileiros contamine seu desempenho na corrida pela reeleição. A solidariedade
da presidente com os jogadores encerrou-se na carta que ela enviou ou grupo
ontem, e não há nenhuma intenção de recebê-lo no Palácio do Planalto. Quem
acompanhou a presidente ao Maracanã ontem disse que Dilma não se deixou abalar
pelas vaias que ouviu no estádio. Segundo fontes próximos a ela, a presidente
deixou o local tranquila apesar de ter sido hostilizada mais uma vez, repetindo
cenário visto no Itaquerão, na abertura do Mundial.
Segundo o deputado
José Guimarães (CE), ex-líder do PT na Câmara, se alguém tentar culpar Dilma
pelo mau resultado da seleção, dará um tiro no pé. Para ele, Dilma chamou para
si a responsabilidade de organizar a melhor Copa da História e não pode ser
responsabilizada pela derrota do Brasil.
— O fato de a
seleção ter sido humilhada é responsabilidade unicamente dos jogadores e do
Felipão. Não tivemos uma seleção à altura do que o governo realizou fora dos
campos — afirmou ele. — A solidariedade que a presidente Dilma teve da
população anula qualquer efeito de vaia. Apostaram no caos, e não teve isso. A
Copa acaba hoje (ontem), e o assunto também. Vamos virar a página e começar a
campanha imediatamente. Amanhã, mãos à obra, militância nas ruas para ganharmos
a eleição.
Mau humor só no
futebol
O deputado Eduardo
Cunha (RJ), líder do PMDB na Câmara, aposta que as atenções vão se centrar
agora na participação da presidente na reunião dos chefes de estado dos Brics
(Brasil, Rússia, Índia China e África do Sul), que acontece esta semana, em
Fortaleza. Para ele, a campanha virá logo depois.
— É necessário
virar a página. Os registros da grande Copa que fizemos vão ficar. A frustração
que ficará é para a história do nosso futebol. Em poucos dias a campanha dará o
tom do debate nacional. É possível que haja mau humor em relação à
desclassificação do Brasil, mas também o consciente reconhecimento de que tudo
funcionou bem na Copa. Dos aeroportos à hospitalidade e alegria do povo
brasileiro — ressaltou, por sua vez, o presidente da Câmara, o deputado
Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN).
Se, por um lado, os
governistas querem virar a página e acham que, mais uma vez, a população vai
ser solidária com a presidente pelas novas vaias ouvidas ontem no Maracanã, a
oposição diz que a candidata do PT gastou sua bala de prata e não terá o
resultado eleitoral esperado se tentar misturar Copa do Mundo com votos.
Um dos
coordenadores da campanha do tucano Aécio Neves, o ex-governador Alberto
Goldman (SP) classificou ontem a presidente como a grande perdedora por ter
tentado “faturar” algo que não é dela: o entusiasmo do povo brasileiro pelo
futebol.
— A presidente vai
amargar a frustração de todos. Mas tudo isso não define as eleições. O que
define é o péssimo governo que ela realiza. Inclusive a herança que a Copa
deixa, que será explícita nas próximas semanas: estádios caros e vazios e
dívidas dos clubes que não serão pagas.
O deputado Beto
Albuquerque (PSB-RS), um dos coordenadores da campanha do presidenciável
Eduardo Campos (PSB) e candidato a governador do Rio Grande do Sul, afirmou,
por sua vez, que os 80% de brasileiros que queriam mudança antes da Copa
seguirão com esse propósito.
— O governo Dilma é
um fracasso. Um retrocesso em relação ao de Lula. Dilma e Felipão são iguais:
ultrapassados, teimosos e sem comando.
Na mesma linha, o
secretário geral do PSB e coordenador da campanha de Campos, Carlos Siqueira,
ressaltou que, independente do resultado da Copa, o eleitorado já deu sinais
claros de que deseja mudar de governante.
— A frustração com
o resultado não é determinante, e todos lamentamos. O eleitor brasileiro tem
muitas razões para votar na oposição e por isso creio que a candidata chapa
branca retornará a sua casa em Porto Alegre. Agora o jogo eleitoral começa para
valer mesmo.
Economia e
propostas definem eleição
Apesar do atrito
evidente entre governistas e oposição, cientistas políticos ouvidos pelo GLOBO
afirmam que ainda não é possível prever se a boa organização e a repercussão
internacional positiva que o Brasil teve ao organizar a Copa pesarão a favor da
presidente Dilma. Eles destacam que, por outro lado, houve o fracasso da
seleção e que ele talvez possa “colar” na imagem dela. A maioria, no entanto,
acredita que o assunto Copa do Mundo será logo esquecido e não deve ter impacto
nenhum na campanha.
Vera Chaia,
professora do Departamento de Política da Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo (PUC-SP), acredita que o assunto será explorado pela oposição, mas
diz que ainda é cedo para saber o impacto que terá.
— É possível fazer
dois balanços dessa Copa. O positivo tem como ingredientes a boa organização,
os estádios funcionando perfeitamente (mesmo tendo sido concluídos em cima da
hora, não houve nenhum desastre) e a diminuição dos protestos. Tudo isso gerou
um efeito muito positivo para os prefeitos e governadores e também influencia a
imagem de Dilma — destaca ela. — O aspecto negativo foi o fracasso da seleção,
que despertou uma série de críticas à CBF e à própria Fifa. Agora que o evento
terminou, as manifestações de rua tendem a voltar assim como as cobranças com o
dinheiro público gasto e os estádios que se transformarão em “elefantes
brancos”. Por isso, ainda é cedo para saber qual dos dois aspectos pesará mais.
Especialista vê
saldo positivo para Dilma
Para o cientista
político Cláudio Couto, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP), o saldo
para o governo e para a imagem de Dilma será mais positivo do que negativo.
— Havia uma
expectativa ruim sobre a realização da Copa, o que acabou não se concretizando.
A reversão de expectativa é sempre mais benéfica do ponto de vista de imagem.
Couto não acredita,
no entanto, que a avaliação positiva da Copa possa decidir as eleições, já que
as pessoas votarão baseadas em outros critérios.
O professor de
ciência política José Álvaro Moisés, da Universidade de São Paulo, vê como
inevitável que a organização da Copa influencie na imagem do governo e da
presidente.
— Essa Copa está
politizada desde o início. Quando o ex-presidente Lula propôs a candidatura do
Brasil, atrelou-a ao desempenho do governo.
Para o cientista
político, desde o ano passado, com os protestos nas ruas, a população se tornou
mais crítica, passando a comparar a organização da Copa com serviços
considerados essenciais.
— As pessoas estão
mais críticas, mas também não é uma coisa direta. Não é porque a seleção
fracassou que a Dilma vai perder a eleição. Mas elas entendem que, a despeito
do clima favorável durante a Copa, o país tem muitos problemas que precisam ser
encarados de frente — acredita.
Já para Fernando
Abrúcio, cientista político também da FGV-SP, a derrota da seleção não deverá ter
impacto em Dilma ou na oposição.
— A Copa só teria
efeito relevante na campanha se tivesse uma desgraça maior do ponto de vista
estrutural. E a verdade é que a eleição reage a estímulos clássicos: economia,
propostas e aliados. São esses fatores que definirão a eleição. Nenhum outro.
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